quinta-feira, 27 de julho de 2017

Galamares, uma breve história


Entre 6ª feira, 28 e 30, domingo, Galamares retoma a tradição das suas festas populares, com música, animação e gastronomia. No recinto da Escola Básica (acesso pela R. Verde Pinho, perto do restaurante Ares da Serra, à direita ou à esquerda conforme quem pela EN-247 venha de Sintra ou Colares) durante 3 dias passarão grupos recreativos como os afamados Top2, (sexta)Os Magos do Ritmo (sábado) ou o Conjunto de Eugénio Barra(domingo) para o serão musical. Oportunidade ainda para a actuação dos Camponeses de D.Maria (sábado, 16h) uma aula de zumba (sábado 18h), o desfile da Fanfarra dos Bombeiros Voluntários de Colares pelas ruas de Galamares (domingo 9h) pinturas faciais e jogos tradicionais (domingo, 15h30m) e a exibição da Banda da Sociedade Filarmónica dos Aliados (domingo, 18h).
HISTÓRIA DE GALAMARES
Galamares, na freguesia de S. Martinho, em Sintra, é um local onde o rural e o bucólico se cruzam e ao mesmo tempo onde estórias da História ocorreram.
Das páginas 149 a 151 da obra “CINTRA PINTURESCA-Memoria Descriptiva da Villa de Cintra, Collares e seus arredores” – 1838, do Visconde de Juromenha, consta uma “descripção da villa de Collares” de há 170 anos atrás. Nela faz-se referência a “Gallamares”, supostamente vocábulo corrupto de “Alaga-Mares” por chegar antigamente a maré àquele sítio, inundando-se, na enchente, o vale por ela percorrido. O autor faz referência à perda de navegabilidade do rio Colares, tendo-se tornado o seu leito, no estio, “vadiavel em toda a parte” (percorrível a pé?). Dever-se-á, segundo o Visconde, a duas causas concorrentes: (i) o progressivo assoreamento da foz, antigamente “limpa e funda“, por onde acediam as embarcações que demandavam o porto de Colares, (ii) e as retiradas de água da ribeira para a rega dos pomares. É ainda referido que, já no ano de 1154, no foral de Cintra, se designava este rio por “Galamar” e que os nomes de alguns sítios em redor do mesmo rio de Collares, designados Porto, Reconcavo, Terra Firme, Auguaria, etc. de alguma forma fundamentam “a conjectura tradiccional de o mar ter occupado estes campos e areaes, a que ainda chamão marinhas, que hoje se veem aproveitados em vinhas e pinhaes”
Pouco povoada, como os inquéritos mandados fazer em 1758 pelo Marquês de Pombal o deixam antever-pouco mais de 40 “vizinhos”, surge no século XIX associada à primeira viagem de balão que se realizou em Portugal, e que vem descrita na Gazeta de Lisboa de 21 de Março de 1819.
Com o advento do romantismo, veio a moda da vilegiatura. Irene Lisboa foi mais uma das figuras que elegeu esta terra como local de vilegiatura, terra que os médicos recomendavam como bons para doenças de pulmões. Nos anos 40 inclusive chegaram a funcionar sete pensões numa terra de pouco mais de 300 habitantes- à época.
Falar de Galamares nos últimos 50 anos é falar da esplanada do Alcino, as Caves de S. Martinho, inauguradas em 1949,e que durante décadas funcionou como pensão, restaurante e café. Muitos veraneantes dos anos sessenta e setenta,ali assistiram ás tertúlias nocturnas de Agosto quando as famílias da capital vinham a banhos, e alugavam toldo ao mês na Praia das Maçãs, e se vestiam para ir á noite ao café, local de encontro social onde chegou a haver uma jukebox, se admiraram os shows de ilusionismo do Xaimix ,e se chegou a pagar para assistir aos jogos do Mundial de Inglaterra, em 66.
Galamares como terra de vilegiatura e de casas esparsas, nasceu como núcleo urbano mais vincado -se bem que irregular- já no início do século XX, a partir da expansão populacional motivada sobretudo pela fixação de famílias que de alguma forma trabalharam para o Visconde de Monserrate e que pela zona da Sanfanha, e depois mais junto á Estrada Nacional nº247 se estabeleceram.
Deve-se ao Visconde de Monserrate o Salão de Galamares, bem como a água cedida através de chafariz público desde 1905.Após a sua morte, e com a dispersão e venda do património e palácio nos anos 40,muito da primitiva propriedade foi desmembrado, tendo ficado como um dos principais proprietários o seu administrador, Guilherme Oram, que por seu turno foi vendendo e destacando parcelas, que se estendiam da Ponte Redonda ao Pinhal das Cavalhadas, e onde, sobretudo a partir dos anos 40 surgiram casas burguesas de veraneio, muito procuradas para se apanharem os “ares ” da serra, a conselho médico, resultantes de vendas efectuadas (um terreno nos anos 40 custava a módica quantia de 15 contos!).
Entre os veraneantes famosos contaram-se Barahona Fernandes, professor e percursor da psiquiatria em Portugal, reitor da Universidade de Lisboa entre 1974 e 1977;Alfredo Guisado, escritor, companheiro de Pessoa e Almada e director nos anos 30 do jornal República; José Gomes Ferreira, escritor, com poemas escritos nas Caves de S. Martinho, que se podem ler nomeadamente no seu livro Poeta Militante; Reinaldo dos Santos, médico eminente; João Medina, professor catedrático da Faculdade de Letras; o radialista Ferreira da Costa, que cobriu as guerras coloniais em África; Maria Eugénia Cunhal, irmã de Álvaro Cunhal,etc.
Outra presença frequenta era o escritor e ensaísta Mário Dionísio. No espólio de Mário Dionísio há fotografias e textos datados que falam do paraíso que era para ele Galamares: entre 1953 e 1957,quando andava às voltas com a «A Paleta e Mundo», obra em fascículos, cujo primeiro volume acabou de ser publicado em 1956, e o segundo volume em 1962.Mário Dionísio tinha alugado uma casa «ao ano», como se dizia, a casinha então isolada do Sr. José da Quinta, que vivia nas traseiras, ao fundo de uma estrada escalavrada que ia da linha do eléctrico lá para cima, na curva onde se vendiam as belas «nozes douradas de Galamares»…
Começou por ficar na Pensão Mariana, o «ferro eléctrico», que era mais barata do que as «Caves de S. Martinho» mais conhecidas por «café do Sr. Alcino», onde foi em tempos a sede da Alagamares. Havia então também a Pensão Maria Duarte e a Pensão Moderna.
Os amigos lá passavam férias ou os iam visitar: Ferreira de Castro, Alfredo Guisado e família,etc.
Existe em Galamares um cine-teatro datado do princípio do século, onde durante anos, mercê da generosidade do visconde de Monserrate se realizaram récitas musicais, teatro amador, cinema, etc, num espaço romântico de fim de século, com balcão e plateia, decorado com pinturas murais e baixos relevos.
O restauro deste espaço foi importante. Trata-se do único espaço público de Galamares, ali tocou Viana da Mota em 1923,e se fez teatro nos anos 40 a 60.O desporto, mormente o ciclismo e atletismo teve igualmente algum destaque.
Em Galamares igualmente funcionou durante anos a Casa das Nozes, das nozes douradas, doce típico hoje quase desaparecido. Há que preservar tal tradição! Porque embora más para o colesterol, a memória também passa pelo estômago. E se Sintra tem as queijadas e travesseiros e Belas os fofos, Galamares tem as suas nozes. Quem pega na receita e a continua?
 A partir dos anos 80 o fenómeno da casa de campo foi-se diluindo e muitos ou se fixaram de vez, bem como seus descendentes, ou venderam as casas, tornando a terra, hoje com 1300 habitantes, mais habitada durante todo o ano, com uma população herdeira dos antigos veraneantes ou dos antigos rendeiros e caseiros que por cá ficaram. Hoje como ontem, á sombra da silhueta de Mil e Uma Noites de Monserrate se vai mantendo o Éden ao pé da Aldeia Grande. Que se mantenha por muitos anos!

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